A Fortaleza Assediada: Taiwan Simula a Defesa Contra a Sombra da Invasão Chinesa
O Exercício Han Kuang e os Limites da Autonomia Estratégica
No coração do Indo-Pacífico, onde as correntes da história convergem com as tensões do presente, Taiwan conduz um exercício militar que é tanto um ensaio de resistência quanto um grito de desafio. Em 15 de julho de 2025, o exercício Han Kuang, o maior treinamento militar anual da ilha, chegou ao seu sétimo dia, com um cenário sombrio: o Exército de Libertação Popular (ELP) da China estabelece cabeças de praia em uma invasão simulada, forçando as forças taiwanesas a bloquear um avanço rumo a Taipé. No centro da capital, o 202º Comando da Polícia Militar fortificou a Ponte Wanban, erguendo barricadas e simulando táticas urbanas para retardar o inimigo. Esse exercício, o mais longo da história com 10 dias de duração, é um espelho das ansiedades de Taiwan: uma nação que, apesar de sua determinação, enfrenta a realidade de que sua sobrevivência contra uma ofensiva chinesa pode depender do apoio de aliados como Estados Unidos e Japão. A história, com sua memória de conflitos que moldaram o destino de povos, nos lembra que a autossuficiência militar é uma aspiração nobre, mas frequentemente ilusória em face de potências avassaladoras.
O Han Kuang, iniciado em 9 de julho, reflete uma evolução na estratégia de defesa de Taiwan. Inspirado por lições da guerra na Ucrânia, o exercício prioriza a descentralização do comando e a resiliência frente a ataques cibernéticos e de desinformação, táticas de “zona cinzenta” que o ELP emprega com frequência, segundo o Reuters. Os primeiros dias simularam respostas a ataques contra sistemas de comando e infraestrutura, com 22.000 reservistas — o maior número já mobilizado — treinando ao lado de tanques M1A2T Abrams, mísseis HIMARS e Sky Sword de fabricação local. Em Bali, no distrito de Nova Taipé, a 269ª Brigada de Infantaria Mecanizada defendeu o Porto de Taipé contra desembarques simulados, enquanto em Lieyu, próximo a Kinmen, guarnições protegeram infraestruturas críticas. Esses cenários, descritos pelo Taipei Times, sublinham a preparação para um conflito multifacetado, onde portos, pontes e o metrô de Taipé podem se tornar campos de batalha.
A China, que considera Taiwan uma província rebelde, reagiu com desdém. O porta-voz do Ministério da Defesa, Jiang Bin, chamou o Han Kuang de “blefe” e afirmou que “nenhuma arma pode deter a espada do ELP contra a independência”. Essa retórica, reportada pelo Observador, acompanha ações concretas: em 8 de julho, 17 aeronaves e oito navios chineses foram detectados perto de Taiwan, com sete aviões cruzando a linha mediana do Estreito de Taiwan. Tais manobras, descritas pelo Global Taiwan Institute, são parte de uma estratégia de intimidação que combina exercícios militares, como o Joint Sword-2024A, com operações de zona cinzenta, incluindo bloqueios navais e ataques cibernéticos. A China, com um exército de mais de 2 milhões de soldados contra os 150.000 de Taiwan, aposta na superioridade numérica e tecnológica, exibindo drones, mísseis e porta-aviões como o Liaoning em exercícios recentes.
A capacidade de Taiwan de resistir sozinha é questionável. Apesar de avanços na modernização militar — com um orçamento de defesa de US$ 246 bilhões em 2025, um aumento de 7,2%, segundo o Radio Free Asia —, a ilha enfrenta limitações logísticas e estratégicas. O Financial Times relata que a complexidade do terreno urbano de Taiwan, como demonstrado nas manobras do metrô de Taipé, é uma vantagem defensiva, mas exige forças altamente treinadas. A confiança do público na capacidade militar é baixa, com apenas 47,5% expressando fé na defesa, conforme uma pesquisa de 2024 citada pela BBC. A dependência de armas americanas, como os 38 tanques Abrams e os mísseis HIMARS, é um lembrete da vulnerabilidade de Taiwan sem apoio externo.
Os Estados Unidos, obrigados por lei a ajudar Taiwan, desempenham um papel crucial, mas a postura de Trump é ambígua. O Financial Times de 14 de julho destaca que o Pentágono pressiona aliados como Japão e Austrália para definirem papéis em um potencial conflito, enquanto Trump evita compromissos claros sobre intervenção militar. O Japão, que considera a estabilidade no Estreito de Taiwan vital, expressou preocupações com as manobras chinesas, conforme o Taipei Times. Contudo, a relutância de Tóquio e Canberra em comprometerem-se plenamente reflete a ambiguidade estratégica dos EUA. A OTAN, embora não diretamente envolvida, observa o Han Kuang com interesse, segundo analistas citados pela Al Jazeera, vendo-o como um teste de resiliência em um mundo onde conflitos como Ucrânia e Gaza expõem os limites da cooperação internacional.
O Han Kuang de 2025, projetado para simular uma invasão em 2027 — ano que marca o centenário do ELP e possíveis ambições de Xi Jinping, segundo o Focus Taiwan —, é um lembrete de que Taiwan se prepara para o pior. A mobilização de reservistas, o uso de drones e mísseis Hsiung Feng III, e a integração de civis em exercícios de defesa urbana mostram um esforço para forjar uma sociedade resiliente. No entanto, a história sugere que nações pequenas, mesmo com determinação feroz, raramente prevalecem sem aliados. Taiwan, como um farol de democracia em um mar de autoritarismo, enfrenta um futuro incerto, onde a coragem de seus soldados na Ponte Wanban pode não ser suficiente sem o peso militar de Washington e Tóquio.
Referências e Fontes Utilizadas:
Reuters, “Taiwan launches biggest war games with simulated attacks against military command,” 9 de julho de 2025
BBC, “Han Kuang: What happens in Taiwan’s military exercise to defend against China?” 9 de julho de 2025
Taipei Times, “Han Kuang military exercises begin,” 9 de julho de 2025
Taipei Times, “Han Kuang drills shift to extended defensive force,” 15 de julho de 2025
Al Jazeera, “Taiwan holds huge war games to role play Chinese invasion scenarios,” 9 de julho de 2025
Global Taiwan Institute, “An Overview of Taiwan’s 2023 Han Kuang Military Exercise,” 9 de agosto de 2023
Newsweek, “Taiwan Readies Soldiers, Civilians for Largest China Invasion Drills,” 3 de julho de 2025
Focus Taiwan, “2025 Han Kuang drills targeting China’s ‘gray zone’ actions, invasion threat: Experts,” 5 de abril de 2025
Global Taiwan Institute, “China’s Military Exercises Around Taiwan: Trends and Patterns,” 2 de outubro de 2024
Taipei Times, “Sustained defense practiced on Day 7 of Han Kuang drills,” 14 de julho de 2025
Observador, “Taiwan inicia maiores exercícios militares de sempre face a ameaças da China,” 10 de julho de 2025
Radio Free Asia, “Taiwan’s annual military drills to simulate 2027 as year of Chinese invasion,” 21 de março de 2025
AP News, “Taiwan begins 10-day military drills to counter Chinese threats,” 10 de julho de 2025
Hindustan Times, “Taiwan begins 10-day military exercises amid China tensions,” 9 de julho de 2025